15 dias completos sem Internet. Cobertura de rede em S. Martinho do Porto, é mentira. Never again.
Qual router, qual banda larga, qual computador topo de gama. Népia. Não havia pauzinhos de rede. Nem 3G nem GPRS.
Resultado? Um stress do caraças, uma caixa de correio com mais de 1000 mensagens à chegada, um leitor de feeds com mais de 3000 novos posts, e, o pior, uma espécie de perda de contacto com a realidade que me deixou doente, quase literalmente. Não volta a acontecer.
Nestas quase 3 semanas não se passou quase nada, a julgar pelos Blogs. Uma séria de assuntos chatos, já não posso ouvir falar de criminalidade, nem de Phelps, nem do presidente da república, nem do divórcio.
Fico-me pelo tema que mais tinta fez correr, o da prestação da comitiva olímpica portuguesa.
Eu tenho os jogos olímpicos atravessados. Nunca saberei se poderia lá ter chegado, nunca saberei se o potencial que viram em mim, quando era miúda, se concretizaria. Fiz natação de competição, a minha especialidade era a velocidade, no crawl. Diz quem acompanhou que eu tinha jeito, e as competições em que participei, ganhei. Mas há 30 anos, a profissão "nadadora" não tinha futuro (hoje tem?) e a exigência que os ritmos dos treinos impactavam com a família toda. Jantares fora de horas, todos os dias, pouco tempo para trabalhos de casa, e o facto de ser muito elegante dentro de água, mas um armário fora dela fizeram com que os meus pais acabassem cedo com a coisa. Ficou-me atravessado até hoje. Não sei, nem nunca saberei, se teria, de facto, podido ir aos Jogos Olímpicos. Portanto, não fui, mas gostava de ter ido.
Isto tudo leva-me não tanto à prestação da comitiva portuguesa, mas aos comentários que se ouviram por cá. Principalmente antes das medalhas.
"À hora do jantar, enquanto come as costoletinhas de borrego com arroz de feijão feitas pela D. Lídia, o Sr. Soares, o esposo, comenta com a esposa que é uma vergonha. Já viste os rapazes e as raparigas? Não querem trabalhar, querem é ir viajar à borla, não se esforçam, e vão para lá, à nossa conta, com os nossos impostos. É para isto que andamos nós a trabalhar e a pagar impostos.
A D. Lídia, enquanto desenforma o pudim ara a sobremesa do Sr. Soares vai ateando a conversa com uns "é uma vergonha" e "a juventude de hoje é uma vergonha".
Andam à volta disto mesmo durante todo o jantar. Andam à volta é como quem diz. Ele anda à volta, ela anda atrás, obediente, concordante.
Um pouco cansada da conversa, a D. Lídia aventura-se como uma mudança pouco subtil de assunto. Ó Soares, veio cá hoje o homem dos caxilhos, trazer o orçamento para fechar a marquise. Em alumínio castanho, lacadinho como nós queremos. Ele diz que se quisermos factura é mais caro, por causa do IVA. Eu disse-lhe que queríamos sem factura, que a diferença faz jeito para darmos de entrada para a estante do quartinho do Fenandinho.
Fizeste bem filha, fizeste bem."
Não me venham falar da merda dos impostos. Devem ser da mesma raça daqueles que sempre que estão a ser atendidos num serviço público sacam logo da cartola com o "são os meus impostos que lhe pagam o ordenado, por isso respeitinho". Coisa que me acontece com alguma frequência, quando refiro que trabalho na PT, coisas do passado, que custam a passar. Quando me dizem isso não desfaço o engano, e devolvo resposta rápida, olhe, então se me paga o ordenado, arranje-me lá um aumento, que o meu ordenado é uma merda e não paga o trabalho de estar aqui a aturá-lo.
Identifiquem mínimos exigentes (e não mínimos para português ver), acompanhem o trabalho dos atletas durante todo o ano. Dêem prémios a quem se dedica e se esforça e se suplanta. Multem ou deixem de apoiar quem faz o contrário, de forma sistemática. Não prometam medalhas. Sejam sérios. Dêem aos atletas uns cursinhos de como falar com a comunicação social, alguns estão bem precisados. Eduquem a comunicação social (que alguma também precisa), e deixem de lado a cultura de apenas olhar para os vencedores das medalhas.
Pela parte que me toca, parabéns a TODOS os atletas que lá foram, e se esforçaram, independentemente dos resultados. Um abraço especial à Naide Gomes. No matter what, continua a ser uma atleta de topo. E quando ganhar qualquer coisinha no mundial, ou nos europeus, ou em Londres, espero que dedique a medalha a todos quantos a vilipendiaram por causa da sua prestação nestes jogos olímpicos. Que lhes dedique a medalha da forma mais rectal possível.