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Jonasnuts

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25 de Abril de 1974. E se o gajo tem disparado?

Jonasnuts, 25.04.10

 

Todos os anos tento escrever sobre o 25 de Abril de 1974, no dia próprio. Mas este ano não via nada de jeito para escrever para além do óbvio, onde estava, onde estaríamos, os blogs não existiam, enfim, tudo coisas que eu própria já referi ou alguém o fez melhor que eu.

 

 

E, embora não consiga ultrapassar o "alguém o fez melhor que eu", surgiu uma pergunta que inspira este post.

 

E se o gajo tem cumprido a ordem e tem disparado?

 

Todos falam do herói que foi Salgueiro Maia (e foi), e muitas vezes, demasiadas vezes, é esquecido o homem que estava do outro lado. O que não cumpriu a ordem. O que não disparou.

 

Nunca o vi em discursos, nunca o vi chegar-se à frente, nunca o vi à procura de protagonismo. E no entanto, merecê-lo-ia. Porque é preciso tomates para disparar, mas são precisos os mesmos tomates (ou maiores) para não disparar.

 

O Alferes Miliciano Fernando Sottomayor recebeu a ordem e não a cumpriu. Disseram-lhe para disparar, e ele não disparou. E se tivesse disparado?

 

Há pouca coisa sobre ele, online. Uma referência num artigo do Diário de Notícias do ano passado, (os senhores do DN mudaram de site, e quebraram o link, ver mais informação aqui) e um PDF, escrito na 1ª pessoa:

AlferesSottomayor.pdf

 

Pela parte que me toca, obrigada por não ter cumprido a ordem. Obrigada por não ter disparado. Obrigada por ter corrido o risco.

 

25 de Abril sempre!

 

 

Adenda: Do outro lado da mira, Salgueiro Maia.

25 de Abril de 1974

Jonasnuts, 25.04.08
Eu sei, toda a gente escreveu sobre o 25 de Abril, e eu não gosto de posts redundantes, mas que se lixe, é 25 de Abril sempre, fascismo nunca mais.

Eu tinha 5 anos. Tenho boa memória. Lembro-me bem desse dia. Inevitavelmente lembro-me de que não houve escola. Mas a minha memória mais forte é a voz na rádio, a avisar, não saiam de casa. E o meu pai a sair porta fora, e a minha mãe ria-se, mas estava preocupada. Passado um bocado o meu pai regressou, e depois voltou a sair.

Os dias seguintes foram uma festa. Por mero acaso, a minha escola, escolhida por ser geograficamente conveniente, era um "ninho" de filhos de presos políticos. Muitos meninos, como eu e a minha irmã, andavam lá normalmente, muitos outros andavam lá, sem pagar nada, por serem filhos de presos políticos. Era o Giroflé. Ainda existe, ali à Estefânea. Evidentemente, para mim e para todos os que frequentavam aquela escola, o ambiente dos dias que se seguiram foram mais festivos ainda.

Era excelente o ambiente que se vivia nas ruas. E alguma instabilidade que sei agora que houve, a seguir, a mim passou-me ao lado, eu queria era ir para as manifestações, às cavalitas do meu pai, gritar palavras de ordem que não compreendia. Fascismos nunca mais, e o povo está com o MFA e essas coisas. Nunca mais gritei palavras de ordem, gosto pouco de carneiradas, mas naquela época valia tudo, e assim como assim eu não percebia nada e engatava na mudança que os meus pais metiam.

Franco, fascista, assassino. O povo unido, jamais será vencido. Força, força companheiro Vasco, nós seremos a muralha de aço. O povo está, com o MFA. 25 de Abril sempre, fascismo nunca mais.

Colar autocolantes à sucapa nas escadas, para a D. Clarinda não nos apanhar, e um dia apanhou-nos, e descobrimos, com surpresa, que afinal, a D. Clarinda, o megafone do prédio, até torcia pela mesma onda. Esquisito.

O 1º de Maio de 1974, na Alameda, foi uma coisa de loucos. O entusiasmo sentia-se, era quase palpável, e toda a gente se ria uns para os outros, e toda a gente se tratava por camarada.

Hoje tento ensinar ao meu filho o que era o tempo antes do 25 de Abril, não que me lembre, mas aprendi, e não consigo. Felizmente o meu filho não concebe um tempo em que não se podem dizer algumas verdades, nem um tempo onde quem diz essas verdades é preso. Não percebe o que é a censura. Não percebe o que são presos políticos. Não percebe nada disso.

Felizmente.