Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]

Jonasnuts

Jonasnuts

O que disse a senhora Merkel, não se diz

Jonasnuts, 06.11.14

Por outro lado, a senhora Merkel não disse aquilo que tentaram fazer-nos crer que ela disse.

 

Vamos por partes. Não nutro especial simpatia pela senhora Merkel. Também não nutro especial simpatia pela grande maioria dos Órgãos de Comunicação Social tradicionais portugueses, ou de qualquer outra nacionalidade.

 

Anteontem não se falava de outra coisa. Fomos mesmo bombardeados com as alegadas afirmações da senhora por órgãos de comunicação social que costumam tentar distanciar-se de outros, enfim, mais useiros e vezeiros nestas matérias.

 

Houve mesmo um ministro que respondeu às alegadas afirmações da senhora. Crato, who else.

 

Nas redes sociais (Twitter e Facebook) foi uma festa. Só comentários indignados, e outros pior ainda. Eu própria comecei por embarcar na coisa.


Mas depois parei para pensar e fui atrás.

Todos citavam a Lusa e Bloomberg. A Lusa referia a Bloomberg. Na Bloomberg, nada. Órgãos de comunicação social espanhóis? Nada. Imprensa internacional? Nada.

 

Eu conseguia encontrar várias notícias sobre o discurso da senhora, mas referências a Portugal e Espanha? Nada.

 

Recorro ao Twitter e ao Facebook. Pergunto. Alguém sabe? Pessoas a viver na Alemanha? Nada. No Luxemburgo. Em Espanha. Em França. Ninguém conseguia encontrar nada.

E eu queria contexto. 

 

E finalmente chega-me o contexto e o enquadramento de que eu precisava, e que me devia ter sido dado pelos órgãos de comunicação social. E chegou-me através da Helena Ferro de Gouveia que deixou um comentário num post que a Helena Araújo escreveu no Facebook.

 

O que a senhora disse foi (adaptado da tradução da Helena Ferro de Gouveia):

 

“Eu peço a todos vocês para tornarem claro nos vossos discursos em escolas e perante jovens: a formação profissional é um excelente pré-requisito para levar uma vida de prosperidade. Não tem necessariamente que se ter tirado um curso superior. Isto é muito, muito importante. Faremos tudo o que estiver no nosso poder, também a OCDE, que nos fornece muitos números úteis que afirmam que não é uma “descida” social, que o filho ou a filha de um trabalhador qualificado complete uma formação como trabalhador qualificado novamente e, de seguida, se torne num bom técnico. Internacionalmente reconhece-se que não é uma “descida” e que isto não significa que o sistema de educação tenha fracassado. Temos que abandonar a ideia de que o ensino superior é o Nonplusultra para uma carreira bem sucedida. De outra forma não poderemos provar a países como Espanha e Portugal, que têm demasiados licenciados e procuram hoje vias de formação profissional, que isso é bom”.

Ora, isto é muito diferente de "Merkel diz que Portugal tem demasiados licenciados". Isto é um "temos, nós próprios, de tomar consciência disto, porque senão não temos moral para dizê-lo aos portugueses e aos espanhóis".

 

Eu não estou a dizer que concordo (o sistema educativo alemão a mim parece-me extraordinariamente estranho), não estou a dizer que a senhora tem razão, e acho que ela está muito mal informada em relação ao número de licenciados portugueses. Não é esse o meu ponto.

O meu ponto é que alguém pegou nisto, subverteu, baralhou, descontextualizou e distribuiu. E quem está no meio da cadeia, devia ter recebido, e devia ter ido atrás. E verificado. E dado contexto. E feito aquilo que eu acho que é o trabalho jornalístico de base. Deviam ter-se informado, para informar. Pelo contrário, desinformaram.

 

E ganharam o quê? Mais cliques. Sem dúvida. Não frequento, mas estou certa de que o número de comentários a esta "notícia" ultrapassou a média habitual.

 

Os nossos órgãos de comunicação social estão a trabalhar para o agora, sprintam. Não estão a trabalhar para o futuro, na construção duma imagem de seriedade e de credibilidade. Pelo contrário, os poucos que ainda têm essa réstia de credibilidade estão a delapidá-la vertiginosamente. Ganham no sprint, mas perdem na maratona.

 

A mim já me tinham perdido, como consumidora habitual há muito tempo. Sou uma mera consumidora pontual, online. E, pelo acima descrito, cada vez menos.

 

Não percebo a estratégia de degradar qualidade e passar a cobrar os acessos (pay per view). É ao contrário senhores. O pay per view só funciona quando a credibilidade e a seriedade são inatacáveis E quando não há alternativa. 

 

Junte-se a isto o que por aí vem de quererem receber para serem indexados no Google (é um caminho que os espanhóis estão adoptar, é uma questão de tempo até chegar cá, caminho, por sinal, já encetado e entretanto arrepiado pelos alemães) e temos o quê?

 

Uma indústria moribunda, sem respostas e sem ideias, que não se sabe adaptar os seus modelos de negócio a novas plataformas e que há-de ir ao fundo.

 

Não faz mal, pelo caminho hão-de pressionar os pressionáveis para que estes criem uma taxa sobre o papel higiénico (auto-link), porque lhes faz concorrência. É uma receita com provas (quase) dadas.

 

 

Edição posterior: O Marco deixou nos comentários um link para um caso exactamente igual, passado há relativamente pouco tempo. 

Porque é que eu não leio notícias em jornais (caso prático).

Jonasnuts, 12.10.11

O meu consumo de notícias já deixou, há muito, de passar pelos jornais. É raro comprar um jornal. Não me lembro já, da última vez que comprei um jornal.

 

Hoje, por conta dum almoço solitário, desfolhei (é tão lindo, usar o desfolhei neste contexto, porque é o que dá, na verdade, vontade de fazer), o Público e o Diário de Notícias.

 

Uma das "notícias" do Diário de Notícias (sem link, não merecem) surpreendeu-me: "Evangeline Lily - Actriz de 'Lost' quer dar à luz em casa".

 

Fonix....a mulher pariu há tão pouco tempo e já está prenha outra vez. Isto é que é produção.

 

Mas depois lembrei-me de que a actriz integrou o elenco do novo filme de Peter Jackson, The Hobbit, e as duas coisas não são compatíveis.

 

Chegada ao meu local de trabalho, fui à procura.

 

Senhores do Diário, a vossa notícia está atrasada quase 6 meses (por 10 dias chegavam ao semestre). Forneço-vos, de borla, um link para o grande guru da informação deste tipo, que qualquer jornalista olha de soslaio, com arrogância e superioridade, o Perez Hilton. Este não anda por aí com peneiras de grande jornalista (anda com outras, mas isso agora não interessa nada para o caso).

 

Se não conseguem, sequer, estar informados sobre coisas básicas, o que é que me garante que o consigam fazer com coisas realmente importantes?

 

 

P.S.: Já para não falar do "dar à luz", que é um termo que me encanita, juntamente com o esposo/a e o falece.

Jornalismo

Jonasnuts, 22.02.11

O Correio da Manhã tem neste momento disponível na sua página de entrada um título e um vídeo. O título "Engenheiro mata com neta ao colo".

 

Um vídeo e uma foto acompanham a "notícia".

 

Nada contra, até aqui, no vídeo até avisam que as imagens podem ofender susceptibilidades mais susceptíveis (eu sei, é de propósito).

 

A questão é que a notícia é só isso.

 

Ficam por responder aquelas que eu acho que são as perguntas a que qualquer notícia deve responder. Não sei, presumo que as ensinem nos cursos de jornalismo. O onde, o quando, o como, o quem, o porquê. Sabem, aquelas coisas que constituem a notícia propriamente dita.

 

Se eu quiser ver um gajo a matar outro, vou ao cinema, e fico mais bem servida, as pistolas fazem um barulho de jeito, o morto cai dramaticamente e está vestido de branco, para se ver o sangue, há diálogos bem construídos, enfim, o que se quiser.

 

Aqui, não percebo, sinceramente, o que é que aquele vídeo lá está a fazer.

 

 

UPDATE: Explicam-me no Twitter, o user do Correio da Manhã @cmjornal, que se trata duma secção que diz "Exclusivos em papel" (e diz). O jornal, em papel, era uma coisa que o meu avô comprava. Esta geração não compra em papel, ou, vá, está a deixar de comprar. Eu, que nem sequer sou da geração web (sou mais velha), resolvi o tema doutra forma. Mas não comprei papel.

Dose diária de desgraça

Jonasnuts, 29.05.09

Acompanho o mais longe possível, tanto quanto me permite o meu dia-a-dia, os casos relacionados com crianças.

 

Não que não me preocupe, pelo contrário, mas porque tenho de me preservar, e acho muitíssimo cínica esta avidez de desgraça.

 

Excluindo os que estão directamente relacionados com as coisas, todos os outros, que falam no café sobre as Joanas, as Maddies, as Esmeraldas e as Alexandras, apenas seguem esses casos para terem a sua dose diária de escândalo e de miséria. São abutres sentimentais. Precisam de olhar para a desgraça alheia para sentirem que, afinal de contas, não estão assim tão mal.

 

E os órgãos de comunicação social, na generalidade, exploram este vício até ao tutano. Afinal de contas, sempre é mais barato comprar um pasquim ou ligar a televisão  do que uma dose de heroína ou cocaína (presumo).

 

A alternativa são as novelas, mas eu acho que as pessoas já não distinguem a realidade da ficção. As novelas e os telejornais são seguidinhos no alinhamento, confunde-se tudo, o tom cada vez menos noticioso e cada vez mais de entretenimento com que nos servem as notícias funciona como uma espécie de aperitivo para a novela que vem a seguir. E as pessoas falam com a mesma normalidade e nas mesmas circunstâncias da criança que foi assassinada e do personagem da novela que foi abusada sexualmente. É um encadeamento. Ficção, realidade, não há distinção, nem é importante que haja......é tudo lá longe, e tudo serve para validar a monotonia da vidinha real.

 

As pessoas gostam de desgraças. Principalmente alheias, mas as própria também. Adoram falar das suas doenças, dos seus problemas, dos seus dramas, adoram receber o olhar de comiseração dos seus interlocutores.

 

E a mim cansa-me, confesso, esta pequenez de espírito.